quinta-feira, 31 de julho de 2014

Se meu filho fosse...

Um poema para todas os pais e filhos

Se meu filho fosse deficiente visual, eu agradeceria a Deus todos os dias porque, mesmo sem sua visão, ele poderia me ouvir e falar comigo. Ele poderia enxergar meu coração como ninguém. Ele poderia me abraçar, andar ao meu lado. Poderia ser feliz por saber que é amado e desejado.

Se ele fosse deficiente auditivo, eu daria graças a Deus por ele poder me ver. Demonstraria a ele com meu olhar e meus gestos, tudo que minhas palavras não pudessem expressar. Eu mostraria a ele o quanto ele é amado e desejado. Eu calaria o silêncio de seus ouvidos com o amor de minhas palavras.

Se ele fosse mudo, ainda assim ele poderia me ver e me ouvir, e eu daria graças a Deus de poder caminhar ao meu lado e me dizer em gestos simples do dia a dia o quanto ele me ama. Eu daria voz aos seus gestos e escutaria suas palavras mais profundas ditas com seu coração.

Se ele fosse deficiente físico, faria uso de suas faculdades mentais para interagir comigo, não precisaria de nenhuma parte de seu corpo para mostrar seu apoio a mim em tempos difíceis ou de rir comigo nos momentos felizes. Ele seria igualmente amado e desejado e eu daria graças a Deus de tê-lo ao meu lado. Eu criaria movimentos para ele.

Se meu filho fosse autista, verbal ou não verbal, eu passaria minha vida procurando maneiras para me comunicar com ele de alguma outra forma. Se ele não olhasse nos meus olhos, procuraria seu amor em cada sorriso seu, em cada vez que ele respirasse, em cada movimento irregular de seu corpo... Eu daria graças a Deus de ele estar vivo e faria com que ele soubesse, todos os dias, o quanto foi amado e desejado nem que tivesse que reinventar a vida ou a forma de viver. Eu faria o impossível para tê-lo ao meu lado.

Se ele tivesse Síndrome de Down, acreditaria em suas potencialidades e riria com ele, choraria quando necessário, andaria com ele só para ouvi-lo falar de suas ideias. Daria graças a Deus por sua vida e faria com que ele soubesse, dia após dia, o quanto é amado e desejado. Eu aproveitaria cada sorriso seu para transformar em um sorriso meu.

Se meu filho não tivesse nenhuma síndrome, deficiência ou diferença, eu mostraria a ele, todos os dias, para que ele visse, ouvisse, interagisse e se fizesse ouvir, o quanto ele é amado e desejado. Daria graças a Deus e amaria cada conquista dele como se fosse a maior, ou a última...

Valorize seu filho, não suas deficiências. Veja quem ele é além da barreira que a sociedade coloca. Acredite que se ele veio a você assim, é porque é assim que tem que ser. Cabe a você encontrar forças onde os outros vêem as fraquezas. Faça com que seu filho saiba que ele é amado e desejado, seja ele como for. Ele é especial. Filhos são especiais...

Anita Brito

terça-feira, 29 de julho de 2014

Nicolas e Izabelle

Acho que vocês já viram a Izabelle por aqui, mas irei reapresentá-la a vocês.

Há alguns anos, fui professora da Belle e, já naquela época, eu me preocupava com inclusão de alunos. Havia um garoto na sala dela que era autista e que não falava com ninguém. Incentivei o grupo da Belle (que tinha a Fernanda, da qual falarei depois, em um outro post) a "adotar" o aluno e ajudá-lo nas atividades de sala e nos trabalhos. Resultado final: no segundo semestre, ele já estava dando seminários e participando de todas as atividades propostas por mim e por alguns professores que se interessaram em ajudá-lo.

Quando o Nicolas foi para o Ensino Fundamental, minha preocupação foi muito grande, uma vez que foi na época que ele teve problemas com bullying na escola. Nesta época, a Belle havia mudado de escola. Quando ela voltou a estudar no Colégio Elyte, começou a participar de algumas atividades que eu faço com os jovens (praticar o bem aos outros, desenvolver o lado altruísta, ajudar aos necessitados etc.). Foi aí que ela conheceu o Nicolas e, algum tempo depois, o Humbert (o irmão intercambista do Nicolas que ele tanto ama e que já falamos dele aqui antes).

O Nicolas e o Humbert se davam muito bem e o Humbert vivia incentivando o Nicolas e ajudando-o em vários aspectos. Inclusive, a estadia do Humbert aqui em casa só ajudou mais e mais na evolução do Nicolas. Mas, quando o Humbert foi embora, o Nicolas sofreu muito. Ele disse que foi a primeira vez que ele experimentou "saudade" e que não gostou nada do sentimento...

Bem, Nicolas viu-se meio que perdido sem o irmão-intercambista e resolveu dar uma chance para outras amizades. Apesar de já conhecer a Belle e gostar dela, o Nicolas aproximou-se ainda mais dela, pois ela também era muito amiga do Humbert. Então, Nicolas decidiu que era hora de sair para o intervalo da escola e enfrentar algo novo para ele (que sempre o assustou!).

Depois da primeira vez que ele foi ao intervalo da escola, super incentivado pela Belle, ele nunca mais se trancou na sala de aula. Aí a amizade dos dois cresceu demais e Nicolas foi amando cada vez mais essa amiga que ele chama de IRMÃ com o maior carinho.

Já saíram juntos várias vezes, se falam pela Internet, pessoalmente, se divertem, se entendem...

Mas na semana passada, eu estava viajando e Nicolas me ligou só para me dizer que ele, sozinho, descobriu o porquê de ele gostar tanto assim dela. Ele me disse que ela tem todo o jeitinho de falar com ele assim como eu falo. E que entende ele assim como eu entendo. Que o ensina quando ele faz algo de errado com o mesmo tom de voz que eu uso e que dá carinho a ele assim como eu dou. Ele me disse com todas as letras:

- Eu vejo você nela.

Isso me emocionou muito, porque eu dou conselho aos alunos como tratar o Nicolas ou qualquer outro aluno autista (ou qualquer outra pessoa, pois sempre prego o respeito e a tolerância com o próximo), mas saber que a Izabelle faz tão bem seu papel de amiga assim, me emocionou demais! Tanto ela, quanto a Fernanda são uns amores com o Nicolas e o tratam com tanto carinho...

Bem, só escrevi este post porque o Nicolas me pede todos os dias desde a semana passada:

- Mãe, será que você pode colocar no blog aquela história que te falei da Belle?

Agora vou parar de escrever e dar para ele ler. Se ele aprovar, vou publicar.

Obs.: Ele disse que era isso mesmo que ele queria. Fez os retoques necessários e me pediu para publicar :-)

À bientôt :-)

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Happy Feet, o Pinguim... Happy?

 O Nicolas simplesmente ADORA assistir ao filme Happy Feet, o Pinguim e, recentemente, assistimos a esse filme algumas vezes, uma vez que estava repetindo muito em uma TV a cabo.

Acho que já comentei com vocês que o Nicolas ama repetir algumas coisas (alguns autistas adoram!) e não é diferente com esse filme. Ele adora algumas partes mais que outras, o que é normal. Porém, notei que ao assistir a algumas partes, o Nicolas fica um pouco triste, o que também normal, uma vez que há algum drama na história.

Perguntei ao Nicolas o que o deixava triste, meio que já esperando a resposta, pois eu acreditava que ele responderia que estava com dó do pinguim. Sim, ele estava com dó do pinguim, porque ele entende que ele está sendo rejeitado, mas também, disse-me ele, porque é assim que ele se sente quando ele tem vergonha de alguma coisa.

Perguntei então a ele, o que que ele faz de diferente a ponto de sentir esta tristeza. Então, ele me disse que, às vezes, tenta participar de algumas conversas e convenções sociais e se sente deslocado e com vergonha.

Perguntei o porquê de, já que ele se sente desconfortável, tentar participar "destas coisas"? Ele olhou para mim espantado e disse: "Ué, como é que eu vou ser feliz se eu não tentar? Dá medo e vergonha às vezes, mas é a vida!"

Ele continuou assistindo e eu fiquei um tempo parada, olhando para ele... Existe limite? Até aqui, ele tem feito como ele quer e não é forçado a nada. Tem total consciência de sua condição, é muito feliz e tenta cada vez mais ajudar a si próprio e aos outros. Mas, e essa vontade de conseguir, de onde vem? Eu sei que não tenho colocado nada em sua cabeça para fazer com ele "mude e deixe de ser autista", contudo, vejo também que não é isso que ele quer. Vejo que ele só quer se encaixar... Ser autista e aceito!

Ao vê-lo gargalhar em uma das partes do filme, aquela gargalhada gostosa e cheia de vida. Daquelas que você, mesmo sem querer, ri junto, percebi que ele se assemelha mais a esse pinguim do que ele imagina. Ele nasceu diferente dos outros, foi rejeitado por uns, não aceito por outros, ridicularizado, questionado, deixado de lado, não entendido por alguns até mesmo da família e ainda tem gente que para tudo o que está fazendo para acompanhar as aventuras do Nicolas...

Ele já veio para mudar! Assim como o pinguim,  que depois de tanto ser apontado como o diferente, mostrou que sua diferença poderia abrir os olhos dos outros. Foi sua diferença que acordou aos humanos e aos pinguins mais velhos. Foi sua diferença que trouxe paz a seu povo e entendimento entre os desiguais.

Nicolas, ainda bem que você nasceu diferente, meu filho. Eu não me transformei em uma pessoa melhor por ser mãe de um autista. Eu procuro melhorar a cada dia porque eu amo ser SUA mãe, meu amor. Obrigada por me ensinar tanto e levar um pouquinho de esperança a alguns.

Lembrem-se: o mundo vai muito além do que imaginamos. As mudanças podem, e devem, começar em nosso próprio meio para que reflita no mundo.


Nicolas aos 05 anos, quando começou a falar um pouquinho...